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Resma de Alfarrábios

Artigos de Fernando Aires. Todas as informações aqui, exceto as de propriedade do serviço Blogger ou citações, são propriedade intelectual de Fernando Aires, e registradas sob uma licença Creative Commons (para detalhes, vide descrição da licença no atalho abaixo). Comentários podem ser escritos na seção "Rabiscos" de cada artigo, e serão benvindos e lidos com carinho.

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domingo, 19 de fevereiro de 2006

Pseudo-intelectuais, a pobreza e os paradoxos da sociedade moderna

Muitas pessoas têm alguns costumes que fogem-me à compreensão, por paradoxais que são. Por exemplo, o de sempre dizer que sua situação financeira está apertada, não importando o real estado dela. Tal é disseminado esse costume, que ganha um pouquinho da minha admiração aquela ou aquele que diz "eu tenho dinheiro suficiente", ou até quem diz "eu tenho dinheiro demais". Não por ter dinheiro, mas por ter essa sinceridade que falta em tanta gente.

Um amigo, cuja família mora num condomínio dos mais caros e luxuosos (a taxa de condomínio é da ordem de milhares de reais), conta que, numa reunião condominial desse lugar, se alguém reclamar da situação financeira, todos dizem "é verdade, está difícil para mim também". Mesmo os que têm aviões, ou detalhes de ouro maciço na fachada de casa. Mas ao mesmo tempo muitas pessoas estão correndo atrás de ganhar sempre mais, almejam ser cada vez mais ricas, e fazem questão de o demonstrar, com carros desnecessariamente luxuosos, jóias de materiais preciosos, ouro e outras tantas formas de ostentação. Eis o paradoxo.

Outro costume que me parece paradoxal é o de taxar as pessoas de "pseudo-intelectuais". Pseudo-intelectual hoje não é quem lê apenas as orelhas dos livros, nem quem se gaba de ouvir Luciana Mello. Não são os que se gabam de ler Paulo Coelho, nem os que acham que qualquer música instrumental é boa, e que o resto não é. Que nada! Hoje basta você assistir a um filme do Ingmar Bergman, ouvir uma música do Chet Baker, ou ler um livro do Nietzsche, que você já é taxado de "pseudo-intelectual". Sem direito a réplica, julgamento, ou sequer um telefonema local.

Quando entrei na faculdade, tinha uma amiga que compartilhava dos meus gostos cinematográficos, e que muito me ensinou sobre cinema. Ela era taxada de "pseudo-intelectual", porque preferia assistir "Vertigo" a "American Pie". Quando comecei a me interessar por filosofia, bastava eu entrar num sebo para comprar um livro novo, e lá vinha o "carimbo". Tenho um grande amigo que é taxado de "pseudo-intelectual" porque gosta de e conhece muito sobre música clássica. Chegou ao absurdo de eu ser acusado de "pseudo-intelectual" por um amigo pelo fato de ter escrito meu perfil no site de relacionamentos Orkut em inglês. Vi, numa lista de discussão, uma pessoa ser chamada de "pseudo-intelectual" por outra porque essa não entendeu a tirinha de jornal que aquela havia enviado. "Pseudo-intelectual" é até mesmo o que fala o português correto, ou sabe o que quer dizer "idiossincrasia".

A situação se inverteu a tal ponto que, se hoje você reclamar da qualidade dos textos do Paulo Coelho, das músicas da Luciana Melo, ou dos filmes do Adam Sandler, você já vira "pseudo-intelectual" por padrão. Isso (eis o paradoxo) numa fase da história da humanidade onde jamais foi tão importante ter conhecimento e cultura. O bem mais importante do indivíduo hoje é a informação (por isso chamamos de "Sociedade da Informação"), mas tentar obtê-la fora do mainstream é razão suficiente para ser taxado com um adjetivo depreciativo.

Não ouso tentar explicar o porquê desses paradoxos. Não sei se é estupidez humana, se passam desapercebidos pelo "labirinto dos pensamentos poluídos pela falta de amor", ou se há alguma razão real prá essa desestabilidade. Vai ver eu é que fiquei ultrapassado, e que o amor hoje em dia seja mesmo as rimas pobres dos pseudo-pagodes, o exemplo a ser seguido é o de um mago que fala português errado (vide o artigo Preconceituoso Lingüístico Esclarecido antes de criticar a expressão ao lado) buscando ter mais uma mulher, e a sabedoria esteja mesmo em se masturbar com uma torta de maçã.

11 Comments:

Blogger tatiana hora said...

boa!

domingo, 16 de abril de 2006 às 15:02:00 BRT  
Blogger Ricardo said...

Uau.

Cheguei nesse post procurando uma resposta pra pergunta "o que raios é a pseudo-intelectualidade que tanto as pessoas chamam umas as outras no orkut?"

Achei teu texto genial, até pq reflete um pouco do q acontece comigo. Não que meu nível de sofisticação musical e literária seja tão alto, mas tem gente que não entende que nem sempre os gostos populares são tão bons pra agradar a todo mundo.

Alguém que rotula um fã adolescente de Chico Buarque de pseudo-intelectual, por exemplo, das duas uma: ou se acha tão superior pra se colocar acima até do próprio Chico Buarque, ou é um invejoso que só está assumindo a própria ignorância chamando alguém de uma coisa que ele queria ser.

Desde quando intelectual virou defeito? Deve ser pq a gente está no Brasil, né.

Um abraço!

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006 às 18:07:00 BRST  
Blogger Fernando Aires said...

Ricardo,

Obrigado pelos elogios. Sei que é um pouco tarde, mas, se você resolver distribuir o texto, apenas respeite a licença envolvida (que te permite distribuir, com poucas ressalvas).

Abraços, Aires

domingo, 3 de junho de 2007 às 10:06:00 BRT  
Anonymous Anônimo said...

Este comentário foi removido pelo autor.

terça-feira, 16 de outubro de 2007 às 02:23:00 BRST  
Anonymous Anônimo said...

Muito interessante o teu artigo!
É... realmente o povo tem mau gosto, e quem vive fora dessa redoma de vidro, isto é, conforme o 'padrão' é, inevitavelmente, taxado de pseudo-intelectual, chato, e por aí vai. Parece-me que, hoje em dia, no Brasil, o "bom" mesmo estar em assistir à BBBs da vida, programas de auditório, bem como gostar de escritores fracos. Bom, talvez isso represente, na cabeça deles (povão), o mais alto nível de entretenimento cultural. (risos)

Em contrapartida, o cara que opta por programas televisivos de boa qualidade, boa literatura e boa música acaba sendo, muitas vezes, alvo de críticas superficiais e, por vezes, equivocadas.

Tchê, não sei quanto a vocês, mas eu prefiro mil vezes ser taxado de pseudo-intelectual a ser massa de manobra, um "besta quadrada" que adota um comportamento padronizado, sem antes questioná-lo, seguindo a moda como se fosse uma religião.

Bom, talvez nem todos concordem comigo, mas esse é o meu ponto de vista.

Mais uma vez, parabéns pelo artigo!
Um abraço.

terça-feira, 16 de outubro de 2007 às 02:30:00 BRST  
Blogger Martchello said...

Eu sempre me rotulei como pseudo-intelectual porque eu me sentia pressionado a isso, e também porque eu sei o quanto eu sou ignorante.
Aprendi a ter um gosto musical apurado, não apenas ouvir música pela mera euforia que ela nos proporciona.
Música para mim tem que ter fundamento agora, digo, sua letra tem que ser significativa. É claro que não dispenso a ‘mera euforia’ de algumas bandas que eu ouvia, mas agora a música tornou-se realmente uma maneira de externar a vontade do ser humano, e gosto de estudar isso. É uma peculiaridade minha, entende?

Gosto de filosofia, gosto de historia, gosto de psicologia, em suma gosto de estudar os mais variáveis assuntos.

Quero desfazer meu pseudo-saber, porem é um trabalho árduo. O que mantém esta vontade de aprender e ousar saber é esta frase que certo dia li de kant: “Aquele que começou está na metade da obra: ouse saber!”

Desculpe-me o desabafo.

E obrigado pelo texto, eu consegui extrair muitas coisas boas dele.

Abraços.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007 às 12:34:00 BRST  
Blogger Thaís said...

Não pude deixar de comentar após ter lido o texto de cabo a rabo.
Cheguei ao seu blog procurando a definição de "psedo-intelectual" no Google ("afinal, qual será a idéia dos internautas sobre o assunto?", pensei) e fiquei fascinada pela sua abordagem do tema. Fantástico! Penso da mesma forma no que diz respeito a essa mania de rotular tudo e todos que a minha (nossa?) geração tem. Não estou me excluindo da onda de rotulagem, não. Eu mesma por vezes rotulo as pessoas, mas considero isso tremendamente estúpido da minha parte; um defeito, e não uma virtude.
Não pude me conter e vim parabenizá-lo. Excelente texto!

ps.: engraçado, a pouco tempo vivi uma situação parecida com essa que você relatou dos pseudopobres.

pps.: para definir pseudo-intelectual, prefiro utilizar-me de uma citação de Sócrates: "Sábio é aquele que sabe que nada sabe". Pseudo-intelectual é, para mim, aquele que exibe um conhecimento que não tem e se contenta com a sua ignorância.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008 às 19:59:00 BRST  
Blogger Unknown said...

Seu pseudo-intelectual!
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
brincadeirinha!

O texto é muito interessante! Realmente hoje em dia vc não pode se interessar por nada que não faça parte do mainstream e consequentemente não pode criticar nada que faça parte do próprio!OU seja,vc tem que concordar com as massas,sem relutância!kkkkkkkkkkk

Bjus=***

segunda-feira, 19 de maio de 2008 às 14:34:00 BRT  
Blogger Outsider said...

Caro,
Meu ponto de vista para esse termo é totalmente outro. Já tive uma comunidade dessas no orkut, hoje não tenho mais, mas o que eu acredito é que um psuedo-intelectual, é aquele que finge, se passar por inteclectual. Não tenho nada contra ser, muito pelo contrário, o que irrita de verdade são aqueles adolescentes que falarm interntes: miguxos, fofuxos, amodoro axim, entre outros e se definem com frases de nietzche no perfil.
Pseudo-intelectual é, para mim, aquele que tenta mostrar um conhecimento que não tem, ou que tem apenas superficialmente. Na minha opinião o pior ignorante que existe é o auto-didata.

;o)

quarta-feira, 11 de março de 2009 às 18:41:00 BRT  
Anonymous Anônimo said...

é realmente irritante essa mania mesmo que as pessoas - e aqui eu me incluo - têm de chingar os outros de pseudo-intectual. Mas, como já disseram, realmente, tem certos padrões de comportamento que "definem" esses pseudo, é claro que só gostar de um bom filme ou de Nietzsche não classifica alguém como um pseudo, mas se a pessoa apenas diz gostar e ainda por cima posa de intelectual falando besteira achando que tá abafando, meu amigo, do que pode-se chamar a criatura ?

sexta-feira, 19 de março de 2010 às 02:03:00 BRT  
Blogger james trenton darius said...

Como a Thaís também cheguei até o blog através do Google e pelo mesmo motivo.
Eu ainda, mesmo após a leitura do texto, fiquei meio confuso quanto a melhor definição do pseudo-intelectual porém após ouvir o comentário do outsider - talvez, o mais perfeito para o meu caso - consegui encaixar num perfil que se relaciona bastante com o arquétipo do pseudo-intelectual. Que por sinal nunca me passou topar com um deles na vida real tanto que os desconhecia.
" O miguxo que usa no perfil do orkut mensagens de grandes pensadores, gênios ou renomados escritores da humanidade sem ao menos os ter lido ' ou lido algúm livro na vida ' ou conhecido mais do que o pouco de que todos falam - ou acham saber dizer. "
Mas se os pseudo-intelectuais são pra lá de superficiais, nada os impede de buscar aprofundar-se naquela citação que ele deixou no orkut. E como disse a Tv Escola o pedreiro que foi tomar um café na Academia Brasileira de Letras : Não existe gente burra e sim cérebros não lapidados.
Deixar de ser raso, buscar conhecer de verdade quem foi tal pessoa... e agora, quem foi Albert Einsten ?
" Todos deviam se perguntar isso já que a tv que eles tanto assistem só existem a mercê de seus estudos acerca do efeito foto elétrico."
E não deviam se envergonhar por se sentirem ignorantes fazendo isso, buscando esclarecer quem foi o HOMEM, - até David Hume já admitiu ser um ignorante porém nada o impediu de melhorar isso até tornar-se formidável.
E digo a todos : Talvez seja a ignorância uma doença incurável em meio a tanta coisa a se conhecer na vida mas estou eu, em humilde gesto, a sempre buscar conhecer mais, para assim, tudo o que aprender vir a facilitar minha vida de alguma forma e me deixar menos constrangido quanto a minha ignorância que sei que existe.
Gostei da postagem e mais ainda da extraordinária franqueza e questionamento do tema que todos aqui abordaram. Saibam que a coragem de vocês ajudou de forma construtiva ao assunto pois contribuiram com um distinto ponto de vista que muitos não assumiram e que eu não havia de pensar por mim mesmo.
Por fim, Obrigado a quem comentou e a quem fomentou a discução ( o autor ) .

sábado, 5 de março de 2011 às 19:28:00 BRT  

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